sábado, dezembro 16

Este Natal, ofereça gratidão

Todos os Natais, a história repete-se. Semanas antes dessa data, começa a correria aos melhores presentes. Seja a Black Friday, as promoções de fim-de-semana ou a oferta dos portes de envio em lojas online, tudo é feito da forma mais inteligente para aliciar-nos a comprar cada vez mais e mais. Parece que toda a preparação para esta data deve começar pela parte material (e quem sabe manter-se assim até ao fim).
Ainda antes de termos a lista de presentes bem definida, já andamos nós, a cuscar os folhetos que nos vêm parar às mãos, cheios de motivos natalícios, na esperança de encontrar o presente ideal. “Este era giro para a mãe, aquele para a sogra, aquele para aquele amigo, e estes para os filhos da vizinha da amiga que uma vez disse-me bom dia e estava tão mal disposta que agora até merece um presente, também…”
Todos os anos, esta história repete-se. Nota-se a diferença nos centros comerciais, pela multidão de pessoas que fazem fila nas escadas rolantes ou nas passadeiras. Vêm todos (ou quase) de lá com as mãos cheias de sacas enormes. Parece que quanto maior a embalagem, melhor o presente… O conteúdo dos carrinhos de compras, usualmente ocupado por legumes, frutas ou detergentes é substituído por caixas de presentes embrulhadas e empilhadas até à altura dos olhos. Parece que quantidade é sinónimo de qualidade. Parece mesmo que nesta altura do ano, ninguém come nada para além de caixas de presentes. Parece que mais importante do que a alimentação é conseguir trazer todos os presentes para casa. “Já comemos o ano todo, nesta altura do ano bem que podemos fazer uma pausa”.
Um mês antes do Natal, e já parece que o mundo esqueceu o quão maravilhoso é aproveitar o sol. Trocam-se os passeios à beira mar, pelos corredores do supermercado. Trocam-se os parques infantis, pelas longas filas de carro. Claro está, que o resto vocês já sabem. Quanto mais próximo está o Natal, maior o caos. Qual furacão Ana? Ou Bruno? Ninguém fica em casa quando se tem o Natal à porta. É necessário relembrar toda a gente, desde o familiar mais próximo ao vizinho mais distante, que no Natal podem comer caixas de chocolate Ferrero como se não houvesse amanhã, só para não fugir à tradição. E, na verdade, ninguém sabe se o mundo acaba no dia 31. Compramos, compramos, compramos. Compramos até a mais, porque podemos esquecer alguém. E, mesmo assim, nos dias antes do Natal, temos as obrigatórias compras de última hora, porque todos os anos falta alguma coisa. Quantos mais presentes conseguirmos ter debaixo da árvore de Natal mais amigos fizemos durante o ano, e mais amigos irão acompanhar-nos no próximo (ou não!). Quantos mais presentes conseguirmos colocar debaixo da árvore mais bonita fica aquela foto que vamos partilhar nas redes sociais. Afinal de contas, bolinhas e glitter só fica bonito no Natal.
Todos os anos, a história passa por isto. Todos os anos, passamos a ser uma espécie de monstro dos presentes. Queixamo-nos do sistema nacional de saúde, quando temos que fazer fila à porta do centro de saúde para conseguir vaga para o nosso filho que ficou doente. Mas, não nos importamos nada de fazer fila à porta do Continente, para aproveitar os 50% de desconto em cartão para comprar aquele presente que o nosso filho tanto pediu… E, para agravar a situação, ainda ficamos orgulhosos com isso: “eu fui o primeiro a chegar, fui logo a correr para o corredor dos brinquedos e consegui aquele brinquedo. Não percebo para o que aquilo serve, mas já só haviam 3 em exposição”. Que orgulho! Que orgulho acordar cedo, esperar horas na fila, correr como se estivéssemos numa maratona ou a fugir dos touros, nas corridas anuais de Espanha, só para assegurar que aquele presente é meu! Mas, se o meu filho precisar de uma consulta no centro de saúde, ai que custa tanto esperar… (Não estou a dizer que concordo com esta espera, mas é só para podermos comparar).

Todos os anos, questiono o verdadeiro significado do Natal.
Mas, é isto o Natal? É este Natal que queremos ensinar aos nossos filhos?
E aquela gratidão? O sentido de partilha? Ajudar o banco alimentar já se tornou tradição. Mas, não o faremos só porque “já está tão enraizado nas nossas tradições” e às vezes “quase somos obrigados a participar com algo porque nos espetam com a saca mesmo à frente dos olhos”? E aquela visita ao vizinho doente e acamado? Ou ao primo que vive longe e que ia ficar tão mais feliz com uma visita ou uma carta, ao invés de um telefonema, na noite de 24, meia hora antes do jantar, porque não tivemos tempo para o visitar mais cedo?
E aqueles amigos que vivem longe? Que tanta falta nos fazem, mas como os portes para presentes pesados fica carito, não lhes enviamos nem uma carta, porque os CTT fazem fila e é uma seca esperar. A estes, fica apenas a lembrança no nosso estado de facebook na véspera de Natal. Ah e tal, deixa escrever aqui no status “Feliz Natal a todos os meus amigos e familiares. Que tenham um excelente Natal, junto dos que mais amam”. Assim, a mensagem despersonalizada e geral serve para todos. E, mesmo que aquele familiar ou amigo não tenha visto, o “recado” estava lá. Ele é que não viu, e temos sempre a desculpa de “ah e tal, perdi o teu número e não tive tempo para te enviar uma mensagem privada…”
Quantos de nós nos empenhamos nesta corrida e busca incessante de presentes perfeitos, quando na verdade, esquecemos de preparar tudo o resto para a chegada do Natal?
Este Natal invertam as prioridades. Escrevam aquela carta ao amigo que vive longe. Visitem aquele familiar que não veem há anos. Subsituam os presentes por verdadeiras lembranças. E, aproveitem o tempo para cuidar de vocês. Aproveitem o tempo para pensar no que gostariam de receber este Natal. Aquela paz que tanto pedimos, se calhar está dentro de nós. Aquela saúde que desejamos, se calhar está na mudança de um hábito que só nos faz mal. Aquela felicidade que toda a gente idealiza, mas que parece só existir na vida dos outros, quando são os outros que conseguem partilhar milhares de fotos perfeitas durante o ano, se calhar, mas assim, só se calhar, está mesmo à vossa frente. Se calhar, está mesmo dentro da vossa casa, nas coisas que vos fazem acordar todos os dias, nas pessoas que vos cumprimentam todos os dias e naquelas que tanto vos pedem um tempinho ao longo do ano.
Por isso, fica o apelo: este ano, ofereçamos a verdadeira gratidão, com gestos, palavras ou até um abraço amigo.

Sejam muito Felizes e agradeçam!

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